sexta-feira, 3 de dezembro de 2010
Chefias e hierarquias às vezes rimam com sacanagem, também
Talvez pela influência de antigas ligações com grupos anarquistas e punks e marxistas, fato é que olho sempre com desconfiança as manifestações de poder. Ontem (02/12/2010) participei de uma curso na E.E. Machado de Assis representando os servidores da minha atual escola, junto com o diretor e outra colega servidora. O curso foi sobre avaliação de desempenho no periodo de 2010. Uma parte dedicada aos aspectos técnicos muito cansativa e muito pouco sobre o conteúdo mesmo dos critérios de avaliação. Mas, esclarecedor quanto ao conteúdo desanimador das carreiras dos servidores públicos no estado de Minas Gerais.
Não vou me ater neste texto a um aspecto pessoal, de que fui vítima na escola em que trabalhei, onde sequer fui notificado até a presente data (03/12/2010) em relação à avaliação de que fui vítima, isso mesmo, vítima em 2009, cuja nota, já soube informalmente, estava abaixo da crítica. Estou aguardando o momento de ser formalmente notificado para entrar com recurso e medidas outras para o reparo da situação em que o servidor é vítima quando agentes públicos com cargos de chefia ou de comissões de avaliação deixam de cumprir o seu papel. No mínimo, além da análise objetiva dos conteúdos e critérios de avaliação, é preciso OBRIGATORIAMENTE notificar o servidor avaliado e dar a ele a chance do contraditório, em prazo regimental e legal para isso, quando se deseja exercer os bons princípios republicanos.
Mas, deixemos o meu caso pessoal de lado e passemos a alguns aspectos da dita lei de avaliação de desempenho com as adaptações próprias ao estado de Minas no período faraônico.
Pelo nosso plano de carreira em vigor, a primeira promoção de um servidor público só acontece oito anos após o seu ingresso no serviço público como servidor efetivo - já tendo sido aprovado em concurso público e nomeado e entrado em efetivo exercício. Ou seja: alguém que esteja se preparando para algum concurso no estado de Minas, é bom que saiba que sua primeira promoção (aquela em que o servidor muda de nível) só acontecerá daqui a uns 10 anos, mais ou menos, considerando o tempo das provas do concurso, a nomeação, o estágio probatório de três anos e mais cinco anos após o estágio probatório. E isso se ele não tiver pelo caminho algum percalço que provoque resultado inferior a 70 pontos, o que adiaria ainda mais a sua primeira promoção.
Em se tratando da área da Educação, a coisa é ainda pior. Primeiro porque os índices de promoção do atual plano de carrreira, que é de 22% para cada mudança de nível, caiu para 10% com a lei do subsídio. Ou seja, a primeira promoção do infeliz professor que ingressar na carreira será de 10% após oito anos da sua nomeação e posse. Agora, se se tratar de uma professora que neste longo período acontecer de se engravidar - e que por direito gozará 6 meses de licença maternidade mais um período de 30 dias de férias -, e se já tiver algum dia de afastamento, mesmo em lincença médica, e com isso tiver menos de 150 dias de efetivo exercício, ficará um ano sem nota de avaliação. Ou seja, perde mais um ano para fins de promoção e progressão.
No curso de avaliação de desempenho, por sinal muito bem ministrado do ponto de vista técnico e de informações - apesar de ser apenas um dia para tantas informações -, a cargo de três competentes servidores da SEE-MG, percebemos algumas "sutilezas" em desfavor do servidor. Por exemplo: a lei diz que o servidor deve ser avaliado por critérios objetivos, com impessoalidade, moralidade, publicidade, etc. Mas, o Estado não pune o chefe ou os membros da comissão que não praticam esses princípios previstos em lei. Não se pode, por exemplo, avaliar um servidor como sendo ineficaz em tal ou qual quesito se este servidor não tiver sido advertido formalmente desta suposta debilidade, até para que ele possa corrigir tal problema durante o período avaliado. Afinal, a avaliação de desempenho não deve ser um instrumento de perseguição de servidores e muito menos de punição, e deveria, em tese, promover o aprimoramento do serviço público. Diante da falha do agente que avalia, cabe ao servidor prejudicado manifestar-se para tentar reparar os prejuízos sofridos - material, moral, emocional, etc.
O foco principal do curso mencionado não é uma aplicabilidade adequada e os métodos para uma boa avaliação, mas a avaliação enquanto instrumento para receber aquela quantia anual a que dão o nome impróprio de 14º salário. E agora a avaliação terá uma parte qualitativa (70%) e quantitativa (30%) dentro de uma aritmética que envolve a nota atribuída pela comissão da escola ao servidor com a nota da Metropolitana a que a escola está vinculada. No final das contas, o desempenho individual avaliado não terá uma nota apenas individual, pois dependerá da nota (um conjunto médio de outras notas) da Metropolitana. Enfim, uma imensa fórmula matemática com muitos dados e médias e percentuais só para se chegar a uma porcentagem daquele valor anual que erroneamente chamam de 14º salário e que tende a ser cada vez mais distante, para baixo, do salário do servidor. Melhor seria se pagassem um salário decente para os servidores que trabalhariam bem mais animados, não tendo que correr atrás de bicos e outros (en)cargos.
Vi alguns diretores se regozijando com algumas supostas ferramentas de pressão sobre os professores, como se estivessem diante de inimigos que devessem ser tratados com chicote. Talvez seja esta de fato a idéia que alguns diretores assumem, quando estão encarnados provisoriamente na função de diretores: o de capitães-do-mato a serviço de uma máquina de estado destruidora de pessoas.
Voltaremos a este ponto em outro texto, quando eu estiver menos irritado com as coisas que vejo e sinto. Quero por fim dizer que de maneira alguma devemos generalizar. Há bons diretores e diretoras e servidores que assumem as comissões de avaliação e que exercem suas funções com seriedade, honestidade de princípios e respeito aos colegas, antes de tudo. Na condição agora de membro da comissão de avaliação na minha escola espero poder prestar contas do meu trabalho aqui no blog, como gosto de fazer com tudo aquilo que pareça com alguma função que possa interferir na carreira ou na vida alheia. Quero que os meus colegas servidores, avaliados pela comissão da qual farei parte, tenham o tratamento o mais digno e respeitoso possível, sendo informados de tudo, com todos os direitos a que fazem jus. Para uma carreira nada promissora como a nossa, o mínimo que devemos fazer é ser tolerantes e tratar com dignidade os colegas, os alunos e a comunidade com a com a qual convivemos.
Incorporo ao texto central os comentários dos nossos combativos colegas professores Marlene de Fátima, Ivone, Luciano, Anônimo e João Paulo.
"Marlene de Fatima:
Também participei de uma reunião desse tipo e senti o mesmo, pois só cobram, querem de nós "milagres", e ainda por cima a jogada desse governo é como um chicote em nosso"lombo" ."
"Ivone:
Possivelmente estava correto quem disse que " o oprimido, só deixa de ser oprimido, quando se torna opressor". Mais revoltante que regras ditadas por burocratas que nunca estiveram em uma sala de aula, são as injustiças cometidas (até com certo prazer e porque não dizer sadismo, escárnio) por "colegas" e diretores que esquecem que tb são professores e um dia estarão de volta à uma sala de aula. Para que alguns professores sejam "ótimos" é necessário que outros sejam ruins??? Não necessariamente um caso pessoal, mas injustiças cometidas nessas avaliações que levam em conta, não o trabalho em si, mas grau de afinidade e porque não dizer... quem "puxa mais o saco", precisa aparecer como MELHOR, mesmo que para isso bons profissionais sejam injustiçados. Triste ver "colegas", como se estivessem entronizados, julgando com tanta facilidade e desconhecimento o trabalho dos outros. Critérios usados? nem eles mesmo devem saber!!! REVOLTANTEEEEEEEEEEEE
Ivone "
"Luciano História:
Não sou contra cobranças desde que se pague bem por elas, cobrar resultados, projetos de intervenção pagando 935,00 é uma palhaçada. A lei do subsídio melhora o salário inicial e eu acredito que ano que vem é que de fato vai ter um monte de cobranças, acontece que sem a valorização do tempo de serviço, sem o reposicionamento anual, sem a fixação para datas de concursos (2 em 2 anos ), de eleições para diretores (3 em 3 anos), sem a fixação do reajuste do salário anual e a redução da jornada os professores não terão estímulos e nem as condições básicas para desenvolverem um bom trabalho. ".
"Anônimo:
Olá Euler:
Final de ano, muito trabalho, e algumas notícias trazidas por diretores que participaram de reuniões da SRE na minha cidade. Uma das novidades é que mais uma vez falam no concurso tão prometido, e o que dizem será no 1° semestre de 2011, e que um dos motivos do atraso no edital são as vagas dos efetivados, onde o Estado está querendo preservá-las, porém o MP é contra. Sobre a regulamentação das 30 horas, os critérios da sua implementação ainda não sairam, o Lei 100 poderá pedir mudança de lotação, outro detalhe, um Lei 100 não habilitado perderá seu cargo caso fique excedente na escola, não terá oportunidade de completar ou mudar de escola. Se o Lei 100 exonerar por algum motivo, não poderá usar o seu tempo para inscrição, valerá somente para se aposentar.
Um grande abraço! "
"João Paulo Ferreira de Assis:
Prezado amigo Professor Euler
Receba a minha solidariedade. Isto de avaliação de desempenho é uma faca de dois gumes. Parece-me uma espada de Dâmocles a pairar sobre todos nós. Primeiramente desculpe-me a ousadia de sugerir-lhe o que fazer, pois o prezado amigo é competente, e não necessita de conselhos. Penso que o prezado amigo deveria solicitar a sua notificação para conhecer oficialmente o resultado da avaliação de desempenho, e tomar as providências cabíveis. E depois, siga um conselho que este amigo lhe dá: DOCUMENTE TODA A SUA VIDA COMO PROFESSOR. Um só objeto que você compre ou um serviço que contrate, peça nota fiscal. Por exemplo: um filme que você alugar na locadora para passar aos seus alunos, uma digitalização de fotos ou ilustrações de livros para enriquecer a aula, um material que você xeroque fora da escola, nota fiscal. Faça um esquema estatístico de atividades corrigidas e não corrigidas, matérias iniciadas e por iniciar. Alunos que fizeram e que não fizeram trabalho. E sobretudo, RECORRA SEMPRE aos vídeos, cd's e dvd's da SRE, pois é uma prova a seu favor. Mostre sempre que está em dia com o CBC(apesar de ser uma agressão à inteligência em certos casos). E se a escola te propuser fazer um curso, ACEITE. Precisamente estou cursando o PROJETO INCLUIR. Nós temos de dançar conforme a música, pois sei de um caso, cujos nomes e indicações geográficas serão omitidos, de um professor, negro, que ousou se candidatar a diretor da sua escola contra a diretora que então exercia, e que era branca. Esse professor foi vítima de um verdadeiro massacre comandado inclusive pelo pároco local. A comunidade era município recém-emancipado do município onde esse professor morava. Ele perdeu e foi perseguido. Só que ele é excelente professor. E a única coisa que a diretora pôde fazer contra ele, foi dar-lhe o 5º horário, 10:40 às 11:30, sendo que ele ainda lecionava à tarde numa outra escola, a 25 quilômetros! Ou seja, ele sacrificou o almoço. Meses a fio, deixando para almoçar às cinco e meia da tarde, causaram-lhe uma úlcera. Quando o pessoal da outra escola descobriu, uma funcionária passou a levar-lhe um prato de comida, e vigiar sua turma do primeiro horário para que ele pudesse almoçar.
Hoje nós temos de ter cuidados redobrados. As SRE's têm disque denúncia 0800 para detonar diretores, professores e funcionários. Quando entregar os canhotos com as notas na Secretaria, peça recibo. Não polemize com alunos. Não vale a pena. Tudo que você fizer, deve ser por escrito, pois verbalmente, as palavras voam, e são esquecidas.
Saudações, João Paulo Ferreira de Assis.
PROFESSOR: DEVIDO A SER UM FATO PESSOAL, PUBLIQUE-O SE LHE APROUVER. "
Comentário do Blog: Amigo professor João Paulo, considerei as suas sugestões e experiências muito pertinentes e úteis não só para mim, mas para todos os colegas professores/professoras e demais servidores da Educação.
Realmente eu já havia solicitado a notificação em algumas ocasiões - a última foi no dia do curso -, mas, como a servidora responsável por encaminhar tal ato me pedia mais um tempo para providenciar os papéis, fiquei na espera. Agora, finalmente, parece que vão me notificar, quando poderei apresentar meu recurso e verificar o tamanho do prejuízo de que fui vítima.
É importante frisar que o ano em questão, 2009 - como de resto acontece em todos os anos de magistério - dediquei-me com profissionalismo aos encargos estabelecidos. Como a maioria dos colegas, não falto ao serviço - a não ser em caso de doença grave, o que felizmente não aconteceu naquele ano, nem no atual e nos sete anos anteriores só tive uma licença de 15 dias para uma cirurgia de visícula -, tenho uma relação de profundo respeito com os alunos - o que, diga-se, é recíproco - e também com os colegas profissionais da Educação. Minhas escritas estavam em dia e participei de todas as atividades da escola, incluindo cursos, festas, Dias Ds, etc.
Até então, naquele ano, era um dos poucos professores a utilizar o laboratório de informática existente na escola, com aulas que diversificavam a costumeira sala de aula com cuspe e giz. Tenho montada uma videoteca com vídeos e músicas que fui recolhendo ao longo dos anos pela Internet ou com a aquisição de fitas e DVDs, com ótimo material de ilustração e reforço para as aulas teóricas.
Mas, além disso, 2009 foi o ano em que convivi com turmas muito agitadas, pelo fato de ter sido o mais novo professor efetivo da escola anterior. Há uma prática de "enturmação" dos alunos no começo do ano, quando os profissionais mais antigos escolhem as turmas que, digamos, dão menos trabalho. Sobra sempre para os mais novos professores na carreira aquelas turmas que reúnem alunos fora da faixa etária, com dificuldades de aprendizagem e consequente problema disciplinar. Na vida de um professor isso é coisa corriqueira.
Há, infelizmente, em algumas escolas, o costume de desconhecer as realidades enfrentadas pelos profissionais e passam a fazer comparações como se isso fosse algum critério de avaliação. No meu caso e de alguns colegas também, pelo fato de ter a língua solta, de não deixar barato as coisas e idéias e práticas com as quais não concordo, seguramente quase sempre desagrado direções e comissões e outras formas de poder. A independência intelectual tem um preço alto a pagar numa sociedade como a nossa, acostumada a impor a vontade dos de cima, a não conviver com críticas, a não saber dialogar com o diferente e a valorizar o puxa-saquismo como método de administração. É péssimo isso, mas é a realidade que se reproduz em quase todas as esferas da vida pública (e privada também) no Brasil.
No meu caso, já pedi cópia de todo o processo de avaliação e quero apresentar recurso no prazo previsto - ou seja, até dez dias após a notificação. Em seguida, me sentindo injustiçado, vou apelar para instância superior. Não descarto a possibilidade de ingressar na Justiça contra atos lesivos à minha pessoa. Fiz questão de omitir os nomes dos envolvidos, para tratar do caso concreto nos foros adequados.
Mas, que sirva de alerta para os colegas: não podemos aceitar a avaliação de desempenho como instrumento de punição, de perseguição, de ameaça ou de vingança de eventuais direções e comissões de avaliação. Este instrumento não pode ser usado para prejudicar a carreira de ninguém. Aliás, nenhum instrumento pode. Não apenas pelo fato de recebermos um salário ridículo numa carreira nada promissora, mas porque este instrumento de avaliação deve ter como finalidade maior o aprimoramento profissional do servidor e consequentemente dos serviços prestados à comunidade.
No caso da Educação é notória a falta de suporte, de condicões adequadas de trabalho, de turmas que fazem o profissional se sentir o mais infeliz dos profissionais, e ainda por cima recebem (recebemos) cobranças e mais cobranças vindas de toda parte. Há escolas que têm muito pouco a ver com um espaço acadêmico e muito de presídio, a começar pela estrutura física, cheia de grades. Não há equipes psico-pedagógicas para acompanhar as dezenas de casos problemáticos que acabam sendo jogados no colo dos professores, que fazem papel de pai, mãe, psicólogo, tomador de conta de alunos, que por conta da realidade social existente não receberam em casa eno seu meio as mínimas noções de educação e de respeito pelo outro. Não é o aluno o culpado, sabemos disso. Mas, que não queiram crucificar o professor pelo desastre social ocasionado pela ausência de políticas públicas e pelo sistema de mercado que engole e cospe cada ser que é marginalizado na cega concorrência pelo dinheiro.
Somente essas realidades descritas - e há muitas outras, evidentemente, como a violência que respinga nas salas de aulas. Quantas brigas eu já tive que apartar em sala, se não quisesse testemunhar alunos causando graves lesões nos colegas? -, sim, somente essas realidades descritas, eu dizia, já seriam suficientes para que todos os profissionais da Educação que reluntante e heroicamente continuem na Educação fossem premiados, jamais sacaneados.
Mas, como disse no primeiro texto, não devemos generalizar. Ainda há muitos bons profissionais, gente séria e digna, que fazem com que ainda tenhamos esperança num futuro melhor para a Educação pública. Pessoas que são boas como profissionais, como seres humanos e como lutadores sociais, também. Desculpem aos colegas se me alonguei demais nesse comentário-desabafo.
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