terça-feira, 4 de outubro de 2011

Euller:"O dia em que o chão de Minas tremeu mais forte."

terça-feira, 4 de outubro de 2011

O dia em que o chão de Minas tremeu mais forte













Vídeo que recebi por e-mail


O dia em que o chão de Minas tremeu mais forte

Em compasso de espera, enquanto a comissão tripartite discute e negocia o nosso piso e outros direitos dos quais não abrimos mão - eu não abro mão de um centavo sequer para este governo e para qualquer grupo máfio-econômico - vamos relembrando aqui, aos poucos, um pouco de alguns momentos que marcaram a história recente de Minas e do Brasil. Uma história contada e vivida por nós, educadores em greve de Minas e apoiadores. Na quinta feira-feira o governo de Minas trará a resposta aos problemas emergenciais da categoria: pagamento dos salários cortados, anistia total aos grevistas, reposição das aulas, anulação das exonerações dos diretores e vice-diretores que entraram em greve. No dia 08 tem reunião do Comando Estadual de Greve. E no dia 10, nova reunião do grupo tripartite para discutir o piso salarial nacional. Enquanto isso, vamos relembrando os momentos da nossa batalha...

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Durante os 112 dias da nossa heroica greve, houve vários momentos de grande mobilização popular e também de ações ousadas, que despertaram a atenção de toda a população mineira e também nacional - e às vezes até no cenário internacional. Tanto na Capital, quanto no Interior, dificilmente passava uma semana sem uma ação direta e organizada pelos educadores em greve. Da caça ao governador, passando por ocupações de rodovias, passeatas, procissões e participação em atos, como o Grito dos Excluídos.

Mas, houve um dia, especificamente, que o chão de Minas balançou mais forte. Trata-se do dia 26 de setembro, um dia antes da suspensão da nossa paralisação.

Os dias que antecederam a esta data já haviam sido marcados por grandes turbulências em Minas Gerais. A ALMG estava ocupada por dezenas de educadores em greve e apoiadores, que lá montaram barracas e iniciaram uma vigília que só terminou com a suspensão da greve, no dia 27. Nestes dias, repercutiu em todo o país o episódio do assessor do líder do governo na Assembleia Legislativa, que teria dito a infeliz frase, gravada e reproduzida pela TV Record e pela Internet: "Se eu ganhasse R$ 712 eu ia ser servente de pedreiro".

Naqueles dias também havia acontecido a ocupação em frente à garagem da ALMG logo pela manhã, impedindo a entrada dos deputados. Para lá se dirigiu o Batalhão de Choque da PM, fato noticiado pela emissora de TV mencionada, já que as demais, ao que parece, nunca pautavam coberturas jornalísticas para os locais onde o chão de Minas tremia. Quem sabe eles têm vertigem à tremura do chão?

Mas, na madrugada do dia 26, o nosso blog já havia anunciado que grandes movimentações estavam previstas. Na Praça da Estação, ocorreria um encontro entre estudantes de universidades, pais de alunos, estudantes da rede estadual, e outros movimentos sociais, entre os quais os sem-terra e os sem-teto, além dos educadores em greve. A mobilização aconteceu, e da Praça da Estação centenas de lutadores sociais marcharam pelas ruas centrais de BH até a Praça Sete, em mais uma manifestação de apoio à greve dos educadores mineiros.

Lá da Praça Sete, recebo telefonemas de dois pontos diferentes: num deles, encontrava-se o tenente NDG Alex, acompanhado pelo 3º Sargento NDG Carlinhos do Machado, por volta das 17h29, que informava: o ato estava se realizando com boa presença de apoiadores; num outro ponto, o pai de aluno Paulo Roberto, NDG apoiador do movimento dos educadores, também nos dava conta de que o ato havia ocupado um dos quarteirões da Praça Sete.

Enquanto isso, na ALMG o clima esquentava. Várias coisas aconteciam naquele espaço. Na entrada daquela Casa, estavam os dois educadores Marilda e Abdon em greve de fome desde o dia 19. Na fachada voltada para o pátio, mais de uma dezena de barracas estavam montadas. Além disso, durante todo o dia acontecera o seminário intitulado "Sala escura da tortura", promovido pelo Instituto Helena Greco (IHG) com o apoio da Comissão de Direitos Humanos da ALMG, coordenada pelo deputado Durval Ângelo. Este acontecimento acabou se transformando num palanque aberto para se denunciar a realidade das escolas de Minas e a situação vivida pelos educadores no estado.

Durante várias horas da manhã e da tarde a TV Assembleia acabou transmitindo ao vivo os debates e as falas de dezenas de educadores em greve que lá se encontravam, de várias regiões de Minas. Foram depoimentos importantíssimos, que mostraram a verdadeira face da Educação e o quadro das escolas em Minas, especialmente no Norte de Minas, mas não somente, onde as escolas e as condições de trabalho são as piores. Foi uma aula de cidadania e acabou mostrando tudo aquilo que a grande mídia, que deveria zelar pela liberdade de imprensa, esconde da opinião pública.

E aqui tenho que confessar um pequeno infortúnio pessoal. Pretendia, desde a noite anterior, participar pessoalmente de todas essas atividades. Já havia combinado com o tenente NDG Alex que nos encontraríamos na Praça da Estação. Enquanto isso, o comandante NDG João Martinho caminharia para a ALMG ao encontro de outros guerreiros. O capitão NDG Rômulo já se preparava para participar dos eventos, mobilizando parte dos seus contatos. E a nossa tropa foi assim distribuída, uma parte daqui, outra dali, sempre de forma horizontal; uma parte iria mais cedo, a outra mais tarde, e assim por diante. Ocorre que no domingo eu passei o dia com uma terrível dor de garganta, com todo sintoma de que poderia evoluir para uma gripe. Clima seco, muita poeira, garganta irritada, acumulada desde os gritos de guerra na Praça da Liberdade e a fumaça das bombas de efeito imoral ali lançadas - e que atingiram, respectivamente, a perna e o braço dos tenentes NDG Alex e Flávio -, passando pelas assembleias, especialmente a da semana anterior, na qual ficamos por quase três minutos gritando, em coro: "Fora Anastasia, fora ditador". Somando-se ao fato de estar atravessando as madrugadas abastecendo o blog com informações e análises, enfim, fato é que amanheci muito mal de gripe e de garganta.

Julguei que deveria reservar (e recuperar) energia para a assembleia que aconteceria no dia seguinte, 27. Além disso, mesmo gripado e com a garganta inflamada, seria possível prestar uma pequena contribuição por meio do nosso blog. E de fato, isso acabou acontecendo.

Por volta de 14h39, recebo o telefonema do comandante João Martinho, informando que cerca de três dezenas de educadores em greve haviam se acorrentado no plenário principal da ALMG. Neste local acontecia o debate sobre a tortura no Brasil e em Minas e era transmitido via TV Assembleia. Colocamos o link desta emissora que transmite ao vivo pela Internet e ao mesmo tempo publicamos, com exclusividade até aquele momento, sobre o novo acontecimento: a ocupação do plenário principal pelos acorrentados. Entrei em contato com o nosso valoroso camarada de luta Nelson Pombo, NDG da área de filmagem, mas ele não conseguiu enviar as imagens ao vivo, como acontecera com sucesso por ocasião dos acorrentados do Pirulito da Praça Sete - acontecimento este que teve repercussão internacional.

Assim que a turma que se encontrava no ato da Praça Sete me telefonou eu pedi para que eles se dirigissem para a ALMG quando terminasse a manifestação, para que pudessem prestar solidariedade e acompanhar de perto o desenrolar dos fatos na ALMG.

O tenente NDG Gleiferson Crow, que estava no primeiro momento junto com os acorrentados, mas depois teve que se retirar, filmou e tirou fotos do acontecimento, passando-nos no mesmo dia por e-mail. Até às 19h, mais ou menos, quando encerram os debates do seminário sobre a "sala de tortura", como estava sendo transmitido em canal aberto, nada acontecera aos nossos acorrentados. Contudo, assim que encerraram as transmissões e o debate, começaram as pressões para cima dos educadores acorrentados. Ninguém mais poderia entrar no local, o uso do banheiro fora proibido e aumentaram o ar condicionado ao máximo.

Por volta de 21h26 recebo novo telefonema do comandante NDG João Martinho. Ele dizia que o Batalhão de Choque fora chamado pela direção da ALMG, que o prédio estava cercado e que a qualquer momento eles poderiam entrar para retirar à força os nossos educadores acorrentados. Tratei de divulgar a ameaça no blog e por e-mail e também por telefone, pois a publicidade do ato fazia-se necessária para tentar coibir qualquer violência por parte da polícia do governo.

Já por volta das 21h55 recebi novo telefonema, dando conta de que os deputados Rogério Correia e Elismar Prado estariam no local tentando negociar com o presidente da ALMG uma proposta para os acorrentados. A exigência dos colegas era simples: que o governo retomasse as negociações pelo pagamento do piso e retirasse o projeto de lei da pauta da ALMG, que destruía nossa carreira. Mas, tudo indica que não houvera avanço em relação a estes pontos.

Do lado de fora da ALMG a movimentação era grande. Recebi um outro telefonema de uma combativa educadora NDG de São José da Lapa, que estava ao lado do Frei Gilvander, com quem conversei rapidamente. Ele havia mandado, um pouco mais cedo, por e-mail, uma carta de apoio do líder do MST João Pedro Stédile, ao nosso movimento. Confirmei com ele que havia recebido a carta e que ela fora publicada. Mas, do lado de fora as pessoas não sabiam ainda qual era a situação real dos colegas acorrentados no plenário principal, pois eles estavam isolados.

Consultando a posteriori as estatísticas de visitas ao blog neste dia, constato que entre 17h e 23h deste dia, o blog recebeu uma média de 1.300 visitas por hora, sendo o pico às 22h, com 1.591 pessoas acessadas ao blog.

Pouca gente soube, por exemplo, que o sobrinho do comandante João Martinho, Luis Carlos Martinho, que falecera há alguns meses, fora lembrado pelos colegas acorrentados: "companheiro Luis Carlos, o professor Manoel: presente!" - gritaram todos. Isto eu só fiquei sabendo bem depois, quando um dos acorrentados, colega aqui de Vespasiano, Sô Geraldo, me relatou os fatos.

Na reunião do comando de greve local, que realizamos após a suspensão da greve, com a participação dos colegas de São José da Lapa e Vespasiano, Sô Geraldo pediu que se parabenizasse a firmeza das mulheres educadoras, que participaram de todos os momentos das nossas lutas, inclusive os de maiores sacrifícios, como os dos acorrentados e a na greve de fome. Foi aplaudido por todos. Ele narrou momentos, por exemplo, como na Praça da Liberdade, quando, impedidas pela força policial de usarem o banheiro, as combativas educadoras acorrentadas eram forçadas a fazerem suas necessidades ali mesmo, protegidas por uma faixa de pano sustentada pelos demais acorrentados.

É importante relembrar também que na conversa telefônica que mantive com o Frei Gilvander, entusiasta apoiador da nossa greve, que ele revelara que havia tentado entrar no plenário onde se encontravam os educadores acorrentados. Invocara inclusive a condição de padre e que, tal como assegura a Carta Magna, pedira para fazer um culto para os acorrentados, direito este assegurado até mesmo nos tratados internacionais. Mas, a direção da ALMG e a polícia legislativa não permitiram.

Por volta das 23h17 recebi novo telefonema do comandante Martinho. Ele informara com entusiasmo que haviam conseguido uma importante conquista: o governo concordara em adiar por 15 dias o projeto de lei contra os educadores e abriria negociação com o sindicato ainda na parte da manhã. Esta proposta havia sido feita pelo governo através do deputado Antonio Júlio, que se encontrava naquele momento ao lado de Rogério Correia. Martinho informara ainda que o banheiro fora liberado e que na porta da ALMG era grande o número de pessoas em vigília e em apoio aos colegas acorrentados.

Depois dessa notícia, fiquei mais tranquilo, pois parecia que o Batalhão de Choque não seria acionado para fazer o papel sujo dos governos, tal como aconteceu no Ceará com os nossos colegas educadores, que lutam igualmente pelo cumprimento de uma lei federal - a lei do piso, sonegada pelos governos, daqui e de acolá.

Por volta de 00:30 recebi o último telefonema do dia do comandante. Ele disse que a proposta do governo não estava confirmada ainda, que o ar condicionado continuava ligado no talo, mas que eles estavam negociando com a polícia legislativa a redução do ar e o uso do banheiro. Disse-me ainda que dificilmente o Batalhão de Choque invadiria o local, o que era uma boa notícia, naquelas circunstâncias. Escrevi aqui no blog que manter o ar condicionado no último furo era prática de tortura, já que alguns dos educadores não tinham sequer uma blusa de frio e passariam a madrugada ali, congelados: com fome, com frio e sem poder usar o banheiro.

Parece-me que mais tarde liberaram o banheiro e a água. E no dia seguinte, enquanto a assembleia acontecia, tivemos a notícia de que o governo de fato resolvera negociar uma saída para aquela situação. O que resultou, após 10 horas de exaustiva espera, na assembleia final que decidiu pela suspensão da greve.

No post do dia seguinte, abri o texto com o seguinte título e subtítulo:

"Aécio, Anastasia e Dilma: responsáveis diretos pela dramática situação em que vivemos

Eles têm dinheiro para a Copa do Mundo, para construir cidades administrativas, para o metrô, para os empreiteiros que financiam as campanhas deles, para os altos escalões dos três poderes, para criar cargos comissionados e contratar cabos eleitorais com altos salários, para comprar a mídia... ... mas, eles não têm dinheiro para pagar um salário digno para os educadores!".

E assim terminou aquele dia 26, que começara com a concentração na Praça da Estação, seguida de passeata pelo centro de BH por centenas de educadores e apoiadores e terminara com a ocupação do plenário principal da ALMG por três dezenas de valentes educadores/educadoras. Num dia marcado por greve de fome, vigília, protestos na TV Assembleia, participação nos debates sobre a tortura em Minas e no Brasil, além da guerrilha virtual que não cessou, como nos outros 112 dias. Tudo isso no dia 26 apenas, quando a nossa heroica greve completara 111 dias.

Seguramente os parlamentares, o governo e os nossos representantes, que compõem a comissão de negociação, que ontem se reuniu na Cidade Administrativa lembrarão destes fatos que marcaram a vida e a história de Minas Gerais.

Que eles não se esqueçam que estão lidando com guerreiros e guerreiras do NDG - Núcleo Duro da Greve - que travaram uma batalha de 47 dias em 2010, e outra de 112 dias este ano. E que se preciso for, caso não haja um claro atendimento às reivindicações imediatas - salários em outubro e novembro, além da devolução do que nos foi confiscado em 2011 - e acerca da implantação do piso e na carreira, verão que um filho deste solo não foge à luta: podem esperar que novas batalhas virão!

Para além da comissão que se reúne para negociar nossos interesses, existe, aqui, do lado de fora, um exército de classe, os educadores do NDG e seus aliados, prontos para retomarem o combate, se necessário for.

Um forte abraço a todos e força na luta! Até a nossa vitória!

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