“Sou como você me vê. Posso ser leve como uma brisa ou forte como uma ventania. Depende de quando e como você me vê passar”.
“Renda-se, como eu me rendi. Mergulhe no que você não conhece como eu mergulhei. Não se preocupe em entender, viver ultrapassa qualquer entendimento”.
“Mas tenho medo do que é novo e tenho medo de viver o que não entendo - quero sempre ter a garantia de pelo menos estar pensando que entendo, não sei me entregar à desorientação”.
“Fique de vez em quando só, senão será submergido. Até o amor excessivo pode submergir uma pessoa”.
"Estremeço de prazer por entre a novidade de usar palavras que formam intenso matagal. Luto por conquistar mais profundamente a minha liberdade de sensações e pensamentos, sem nenhum sentido utilitário: sou sozinha, eu e minha liberdade. É tamanha a liberdade que pode escandalizar um primitivo, mas sei que não te escandalizas com a plenitude que consigo e que é sem fronteiras perceptíveis.
Esta minha capacidade de viver o que é redondo e amplo - cerco-me por plantas carnívoras e animais legendários, tudo banhado pela tosca e esquerda luz de um sexo mítico. Vou adiante de modo intuitivo e sem procurar uma idéia: sou orgânica. E não me indago sobre os meus motivos. Mergulho na quase dor de uma intensa alegria – e para me enfeitar nascem entre os meus cabelos folhas e ramagens." (...).
Fonte dos textos:
http://www.pensador.info/autor/Clarice_Lispector/5/
Fonte da imagem:
wwwdepassagem.blogspot.com/2007/08/gua-viva-c...
Recebi uma lição de um de meus filhos, antes dele fazer 14 anos. Haviam me telefonado avisando que uma moça que eu conheci ia tocar na televisão, transmitido pelo Ministério da Educação. Liguei a televisão mas em grande dúvida.
Eu conhecera essa moça pessoalmente e ela era excessivamente suave, com voz de criança, e de um feminino-infantil. E eu me perguntava: terá ela força no piano? Eu a conhecera num momento muito importante: quando ela ia escolher a "camisola do dia" para o casamento. As perguntas que me fazia eram de uma franqueza ingênua que me surpreendia. Tocaria ela piano?
Começou. E, Deus, ela possuía a força. Seu rosto era um outro, irreconhecível. Nos momentos de violência apertava violentamente os lábios. Nos instantes de doçura entreabria a boca, dando-se inteira. E suava, da testa escorria para o rosto o suor. De surpresa de descobrir uma alma insuspeita, fiquei com os olhos cheios de água, na verdade eu chorava. Percebi que meu filho, quase uma criança, notara, expliquei: estou emocionada, vou tomar um calmante. E ele:
-Você não sabe diferenciar emoção de nervosismo? Você está tendo uma emoção.
Entendi, aceitei, e disse-lhe:
-Não vou tomar nenhum calmante.
E vivi o que era para ser vivido.
Pinturas de Clarice Lispector
Fonte: A crônica e as fotos que ora publico foram retiradas do blogue Brigada contra a corrupção brasileira, cujo autor é muito amigo da minha irmã, Iara. Gostei muito. Também não conhecia a Clarice artista plástica. Por isso peço licença a Nando (posso chamá-lo assim?) para publicá-las. Desde já, muito obrigada, Nando!
Observação: Quando vejo as fotos de Clarice lembro do olhar da minha mãe.
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LITERATURA
Clarice Lispector é a nossa Maria Callas
Clarice Lispector é a nossa diva, a nossa Maria Callas. É uma princesa quirguiz, com olhos urálicos e ar uzbesque. Estive, com uma amiga, na exposição sobre ela, no Centro Cultural Banco do Brasil, em Brasília. É uma mostra muito tocante de imagens e palavras. Numa primeira seção, fotos esmaecidas em polaroide ficam por trás de vidros com textos de Clarice. As fotos de Clarice são uma literatura por si mesmas. São dois textos superpostos: o das fotos e o das obras. É impossível ver com atenção uma foto de Clarice sem criar uma mitologia: quem era essa mulher? Que tipo de beleza absurda e contida é essa?
Bastam as fotos para ver como é difícil enquadrar Clarice. Feminista? Sim, largou o marido diplomata e foi viver com os filhos no Rio de Janeiro. Mas também, claramente, uma dona de casa, que faz a feira e arruma os filhos. A forte ligação com os seus meninos é visível na exposição. Numa segunda seção da mostra, há uma sala com gavetões até o teto, e em alguns deles há documentos sobre a vida de Clarice: cartas, sobretudo. Como se pudéssemos ver a privacidade dela, como se isso fosse possível.
Ela chamava seus filhos de grilo, gafanhoto. Não posso imaginar uma mãe mais amorosa do que essa que, numa carta, manda 10 dólares para que seu filho, que está estudando nos Estados Unidos, possa fazer “uma farrinha”.
E como essa diva escreve bem! Vou citar aqui só o uso de dois adjetivos no livro Via Crucis do Corpo, que foi publicado em 1974. Primeiro exemplo: “o sol estava tão guerrilheiro, tão bom, tão quente, que não leu nada...”. Um “sol guerrilheiro” é uma imagem perfeita para um sol que nos ataca pelos flancos e que nos transforma sem nos destruir.
Neste mesmo conto, intitulado Miss Algrave, no qual um extraterrestre, duende ou íncubo, vira amante de uma puritana inglesa, a primeira sensação da moça ao sentir a presença do ser estranho é de “frisson eletrônico”, o que já diz tudo.
Clarice gosta de brincar conosco, apesar de dizer que é “uma mulher séria”. Ela escreve um livro erótico em que ETs transam com inglesas e diz que pediu autorização dos filhos para publicar tais contos! Vocês imaginam Simone de Beauvoir pedindo autorização a um parente para publicar qualquer coisa? Em outro conto de Via Crucis do Corpo, a narradora desdenha da literatura: “Sei lá se este livro vai acrescentar alguma coisa à minha obra. Minha obra que se dane. Não sei por que as pessoas dão tanta importância à literatura”. E no entanto a literatura dela tem essa seriedade leve e quase insuportável que nunca se consegue colocar numa carta ou num e-mail; a literatura é muito mais que essa biografia em gavetas, mas, ah, as fotos dela valem tanto quanto a literatura. São, também, signos do que não se entende.
Saiu no ano passado uma fotobigrafia fantástica (Clarice – Fotobiografia, de Nadia Gotlib, Imesp, 2009). Notei que em nenhuma foto do tempo de casada ela está abraçada a seu ex-marido; havia sempre alguns centímetros de distância entre eles. Algo aterrorizava o marido diplomata? Mas Clarice é essencialmente uma mulher abraçável. É difícil entender essas coisas.
Por fim, na exposição, reproduz-se uma entrevista dela a uma emissora de televisão, pouco antes de morrer. Está cansada, envelhecida. Mas ainda assim parece maternal, afetuosa, embora sarcástica. Fala com um sotaque estranho, pernambucano da Ásia, um pouco de língua presa, um erre trocado, tudo muito sibilante, embora arrastado. Não sorri mais. Sabe que vai morrer? Já não parece uma diva, agora podia ser a minha mãe, ou a tua. Mas a inteligência está intacta, algo a incomoda, está tensa, está só e está conosco. Diz: “Todo ser humano é triste e solitário”. Diz que está morta. Mas que vai viver amanhã. Em Via Crucis do Corpo, a narradora disse que todo sucesso é uma mentira. Mas não é questão de verdade ou mentira. Clarice é uma diva que cabe nas fotos.
Ela diz, na entrevista, que é uma pessoa simples, não é um mito. Nada mais transparente. Faz parte do mito dela ser simples, a mulher que podemos amar e que nos escapa. Eu disse à minha amiga que se Clarice fosse francesa seria um mito nacional, como Simone de Beauvoir. Os franceses são criadores de mitos. Os brasileiros, devoradores. Mas talvez seja melhor assim. Clarice, com museu e mitologia, deixaria de ser simples. Está bem que ela fique como está, como fotos nas gavetas. Desde que sejam as nossas.
* Professor de linguística da UFSC
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A casa dos Lispector
Por Cosac Naify
Terça-feira, 11 maio, 2010, às 11:48A casa onde Clarice Lispector passou a infância no Recife será transformada em um centro cultural, que ganhará o nome da irmã da escritora, Elisa Lispector. A notícia, apurada pela coluna da Mônica Bergamo, no caderno Ilustrada da Folha de S. Paulo, revela, ainda, que a sobrinha-neta de Clarice, Nicole Algranti, é quem está à frente do projeto. A arquidiocese da capital pernambucana cedeu o imóvel a ela, na praça Maciel Pinheiro, em comodato, onde será criado um instituto voltado ao incentivo à literatura e ao cinema.
Clarice nasceu na Ucrânia, país de onde seus pais conseguiram escapar, fugidos da perseguição nazista. Ao chegar ao Brasil, os Lispector se estabeleceram primeiro em Maceió e, depois, no Recife, lugar que abrigou muitos judeus desde pouco antes da Primeira Guerra. A escritora tinha cinco anos quando chegou à cidade, e lá passou a infância, antes de se mudar para o Rio de Janeiro com a família. Recife foi, para Clarice, a referência mais importante, a terra à qual sentia que pertencia de fato. “Pernambuco marca tanto a gente que basta dizer que nada, mas nada mesmo nas viagens que fiz por este mundo contribuiu para o que escrevo. Mas Recife continua firme.”
Benjamin Moser, autor da biografia Clarice, (2009), escreveu sobre os últimos momentos da escritora, que teve a vista da praça da infância como uma de suas últimas imagens.
“Meses antes de morrer, Clarice Lispector fez sua última viagem ao Recife, para dar uma palestra na universidade. Ela insistiu em se hospedar no Hotel São Domingos, na esquina da praça Maciel Pinheiro, onde ficava o velho banco judaico. Passou horas na janela olhando para a pracinha onde crescera. Para a pequena Clarice, conforme ela lembrou numa entrevista, aquele jardinzinho, onde os motoristas de táxi flertavam com as empregadas domésticas, parecia uma floresta, um mundo onde ela escondera coisas que nunca mais conseguiu recuperar.Depois de todos aqueles anos, só a cor da casa tinha mudado: ‘Minha lembrança é a de olhar pela varanda da praça Maciel Pinheiro, em Recife, e ter medo de cair: achei tudo alto demais [...] Era pintada de cor-de-rosa. Uma cor acaba? Se desvanece no ar, meu Deus.’”
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Descoberta a primeira
entrevista de ClaricePor Cosac Naify
Sexta-feira, 12 fevereiro, 2010, às 08:20Neste mar de informações que é a internet – e, particularmente, o Twitter -, aqui na Cosac Naify nós pescamos um comentário da artista plástica Pinky Wainer sobre suas descobertas a respeito de seu pai, o jornalista Samuel Wainer, por meio da leitura de Clarice,. Um dos maiores nomes da imprensa brasileira, Samuel acompanhou – e interferiu – na vida política e cultural do Brasil durante as décadas de 1950, 60 e 70.
Decidimos jogar a nossa rede e propor à Pinky que escrevesse mais sobre esses (re)encontros tão pessoais. Pedido feito, só não imaginávamos o quão precioso seria o material que ela nos enviaria.
Leia a seguir o depoimento de Pinky Wainer e, na sequência, uma grande surpresa: a primeira entrevista concedida por Clarice Lispector, então uma jovem estudante universitária, garimpada em uma edição de 1941 da revista Diretrizes. “Que coisa fascinante”, disse Benjamin Moser, autor da biografia, quando conheceu estes textos. “Os claricianos vão adorar!”. Sendo assim, vamos a eles:
SE ALGUÉM SOUBER, ME CONTE
“Você sabia que seu pai está presente em boa parte da nova biografia da Clarice Lispector?”, me disse um amigo. Levei um susto. Comprei e comecei a ler, claro, pelo índice remissivo e as citações de Samuel Wainer. Eram muitas mesmo. Clarice havia sido uma das grandes amigas de Bluma, primeira mulher de meu pai. Os casais Gurgel Valente e Wainer conviveram nos anos 40, época de Diretrizes – revista mensal fundada por Samuel Wainer em 1938 – e da luta contra o Estado Novo de Getulio Vargas, que terminou com o fechamento da publicação e o primeiro exílio político de meu pai. Ele foi para a Europa onde cobriu, para os Diários Associados, a Segunda Guerra Mundial e também o Tribunal de Nuremberg. Bluma estava sempre com ele.
Mas Clarice e Samuel também eram muito próximos em suas origens, então desconhecidas pelos brasileiros.
Meu pai contava para nós, os filhos, uma história leve e divertida sobre a “sementinha” – como ele dizia –, de onde brotaram os Wainer. Vou resumir: a família vivia num vilarejo na Bessarábia e havia pogroms constantes, cometidos por agressores de várias etnias. Numa só noite, uma trisavó Wainer foi estuprada por vários homens de etnias diversas. “Por isso nunca saberemos exatamente de onde viemos”, ria meu pai, melancolicamente. Conforme Benjamin Moser nos relata, a mesma história de horror e sequelas aconteceu com a mãe de Clarice.
(Preciso dizer que a pesquisa de Benjamin Moser é fantástica. Eu lia e me vinha à cabeça a falta de preguiça do escritor. Aliás, falta de preguiça ou tempo e dinheiro para pesquisa? O autor conta, de maneira didática e detalhada, como era a vida dos judeus pobres da Europa Central. Muitos vieram para as Américas no início do século XX. Nesse sentido, Clarice, relata, para os descendentes de judeus asquenazim, a história de seus antepassados. Praticamente um livro dentro do livro.)
Jamais consegui entender muito a literatura de Clarice. Mas adoro suas crônicas, contos e livros infantis. Cheguei a ilustrar alguns. Para compensar, li muito sobre ela: Clarice Lispector é, em si, um livro muito bom. Um livrão. Com uma história muito triste.
A turma de intelectuais contemporâneos a Clarice e Samuel virou história. Eram todos de esquerda, fundando publicações, lançando manifestos, brigando, namorando, sendo presos, cortejando o poder, roubando a mulher do amigo. Enfim, vida real, regada a uísque, cigarro e anfetaminas. Acredito que além do talento, eles ainda tiveram a chance histórica de estar no auge do vigor no pós-Guerra: A Idade de Ouro, como diz o historiador Eric Hobsbawm.
Enquanto o grupo desfrutava essa turbulência criativa, a biografia de Moser fala de uma Clarice deprimida, triste. Seu amor por Lucio Cardoso precisou ser platônico. Seus livros, tão importantes, recebiam críticas oscilantes. Sua vida de mulher de diplomata não a satisfazia. No livro ela diz: diplomatas não fazem amigos, diplomatas almoçam (ou algo parecido). Assim, seu casamento logo se amornou. Mesmo com o nascimento de seus filhos e as lindas paisagens suíças, italianas e depois americanas.
Já velhinho, meu pai ficava fazendo charme e costumava contar pequenas histórias engraçadas de sua convivência com alguém de muito prestígio, ou grande inteligência, ou dinheiro, ou muito nobre. Mas nunca, nunca mesmo, falou no nome de Clarice. Nem para falar mal. O que ele fazia às vezes, em família.
Eu transcrevi as 52 fitas K7 que ele deixou gravadas e foram a base para o livro autobiográfico Minha razão de viver, editado por Augusto Nunes. Nas fitas também inexistem referências a Clarice. Encontrei apenas uma foto de Samuel Wainer, a escritora e o marido diplomata juntos em Paris.
É muito estranho não haver nada. Deve ter ocorrido uma briga feia. Mas muito feia mesmo, da qual Samuel Wainer preferiu não lembrar. Quem sabe algo sobre a separação de Bluma. (Em algum momento Bluma, casada, se apaixonou por Rubem Braga, um dos melhores amigos de Samuel Wainer. Tiveram um caso e ela engravidou. Procurou Rubem que, também casado, “fugiu” da responsabilidade. Tempos depois Bluma teve câncer e Samuel Wainer cuidou dela até a morte.)
O livro também conta que Bluma ficou horrorizada quando Samuel Wainer se uniu a Getúlio, em 49. Eram de esquerda e a ideia de uma aliança com o velho ditador era chocante. Mas Clarice foi redatora do DIP no Estado Novo! Nada disso era suficiente para Samuel Wainer não falar sobre Clarice. Não sei de nada. Se alguém souber, me conte.
***
Enquanto isso, o jornalista Vilmar Ledesma, meu amigo de Twitter, me enviou preciosidades. Vilmar garimpou volumes de Diretrizes do acervo da Biblioteca Mario de Andrade, em São Paulo, e transcreveu algumas coisas importantes (à mão, pois lá não é possível tirar xerox devido ao estado precário dos arquivos!). Coisas que devem ser inéditas para o grande público, já neste século XXI.
OS ESTUDANTES BRASILEIROS E A LITERATURA UNIVERSAL
(Diretrizes 71, 30 de outubro de 1941)Série de reportagens com universitários, no final de outubro de 1941, opinando sobra literatura. A ilustração é de uma garota bonita, com bolsa embaixo do braço, cercada por cinco rapazes e a legenda “Futuros advogados falam sobre literatura”. Lá no final da primeira matéria vem o seguinte trecho:
“Na Faculdade de Direito subimos ao primeiro pavimento do edifício da rua Moncorvo Filho. Descemos novamente e vemos chegar uma jovem a quem abordamos. Chama-se Clarice Lispector e tem traços da raça eslava. É terceiro-anista e acede prontamente em responder às perguntas do repórter. “Leio de preferência livros, diz Clarice. Quanto à literatura nacional, em minha opinião, temos ótimos escritores, capazes de rivalizar com qualquer outro de qualquer literatura. Sobre a moderna literatura nacional, conheço alguma coisa; mais talvez do que a antiga”.
Pode destacar algum vulto?
Vários, como Graciliano Ramos, que me parece o maior, Rachel de Queiroz, Augusto Frederico Schmidt, etc.Na literatura moderna nacional existe algum escritor que em sua opinião possa se nivelar a Machado de Assis ou Euclydes da Cunha?
Não se pode tomar para comparação um Machado de Assis, tão pessoal na sua obra. Mas em intensidade literária, dentro do seu próprio gênero, há escritores atuais que podem até superá-lo. Aliás, em minha opinião, seria mais fácil superá-lo do que igualá-lo. Machado tinha muita personalidade. Como romancista, ele não é seguro, não obedece a normas; por isso me parece fácil superá-lo, mais que igualá-lo. Euclydes da Cunha não me agrada…Qual o livro nacional ou estrangeiro que lhe tenha deixado mais impressão?
Esta é uma pergunta difícil… Porque eu sempre passo épocas em que tal ou qual livro me impressiona. Depois o esqueço e outro toma o seu lugar. Às vezes o que me agrada num livro é o “tom”, o plano em que o autor se move. E se em outro livro o autor muda o “tom”, eu perco o interesse. É um estado d’alma.Acha que a Guerra possa influir sobre a literatura?
Pode. Talvez um certo ceticismo se apodere da literatura do após-Guerra. Também os motivos humanos ocuparão seu lugar. Mas ao certo não se pode prever.Qual a sua opinião sobre a “coleção das moças”?
Corresponde a uma necessidade da idade. Há uma fase na vida da moça em que tal literatura é indispensável. Mas apesar de eu já ter sofrido essa necessidade, hoje tenho pena das moças que lêem exclusivamente esta literatura.E sobre literatura infantil?
Monteiro Lobato é sozinho uma literatura neste gênero. Suas obras compõem o que há de melhor a este respeito no Brasil. Além disso, temos Marques Rebelo. Ainda não se pode, todavia, confiar em uma literatura infantil no Brasil.E sobre a poesia?
Eu nunca procurei a poesia. Gostei sempre mais da prosa. Admiro particularmente Augusto Frederico Schmidt.Qual o maior poeta nacional em sua opinião?
Eu diria Castro Alves porque sei que é o melhor. Mas não tenho apreciação por condoreiros. Se a pergunta se refere aos que gosto, posso falar de Augusto Frederico Schmidt, com o seu Cântico de Adolescente que muito me impressionou há anos atrás.Quais os melhores livros da literatura universal, na sua opinião?
Humilhados e ofendidos, Crime e castigo, de Dostoievski, Sem olhos em Gaza, do Huxley, Mediterrâneo, de Panait Istrati e as obras de Anatole France em geral. Mas isto é só do que já li.”Depois a própria Clarice se encarrega de nos apresentar a um colega. Augusto Baêna, quarto anista e presidente do Centro Cândido Figueiredo da Faculdade de Direito.
(Na foto da reportagem, Clarice aparece com saia xadrez bem miudinho, blusa gola role reta de manga comprida, bolsa tipo carteira embaixo do braço e cabelos em quase coque.)
***Vilmar Ledesma encontrou também a crítica publicada na revista Diretrizes de 10/02/1944, sobre o primeiro romance de Clarice Lispector, Perto do coração selvagem. Publicado no Balanço Literário, com a recomendação “Leia, Se Quiser…”
“Perto do coração selvagem – 10/2/1944
Um romance muito interessante, muito vigoroso, mas cheio de falhas que revelam a estreante, ainda não acostumada ao domínio de seus temas. Desordenado e vigoroso, este romance sobre a infância de Joana marca, sem dúvida, o aparecimento de uma romancista, que precisa apenas se disciplinar – e evitar certas seduções vulgares de que o seu livro dá provas – para realizar grandes romances. Uma experiência em grande escala – e quase inteiramente bem-sucedida.”Vilmar me disse mais…“Olha como ela fala dessa crítica numa carta de Belém pra irmã que consta no livro da Nadia Gotlib”, disse ele. “Diretrizes classificou o livro no “Leia se Quiser”, tratando-me com palmadinhas paternais nas costas, carões e conselhos. Chato e eu não ligo.”
Pinky Wainer
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O último combate de Elza
Por Cosac Naify
Quinta-feira, 10 dezembro, 2009, às 15:15Quando as “cobras-fumantes”, as tropas da Força Expedicionária Brasileira, desembarcaram em Nápoles, em 1944, duas mulheres ajudaram a tornar mais leve o fardo dos homens que foram lutar numa guerra cujas razões nem sequer diziam respeito a seu país. Uma delas, Major Elza Cansanção Medeiros, faleceu nesta terça-feira (8/12), aos 88 anos. Elza era a mulher mais condecorada do Brasil, segundo o Comando Militar do Leste, com 35 medalhas; a primeira brasileira a se apresentar como voluntária na Diretoria de Saúde do Exército, para lutar na Segunda Guerra Mundial, aos 19 anos.
Na Itália, Major Elza conheceu Clarice Lispector, que acompanhava o marido diplomata. “Como não havia assistentes sociais no Exército brasileiro, Clarice ‘solicitou das autoridades militares, quer brasileiros, quer americanos, autorização para diariamente visitar o hospital e conversar um pouco com os doentes’, lembrava Elza.” Quem nos revela o fato é o norte-americano Benjamin Moser, autor da biografia Clarice,.
“Nos lançamentos de Clarice, em São Paulo, Rio de Janeiro e Recife, as pessoas perguntaram muito sobre as minhas experiências durante o processo do livro. É uma aventura fascinante, sobretudo por causa das pessoas que se encontra pelo caminho. Sempre comento sobre a veterana mais antiga da FEB, a Major Elza, que ainda se lembrava de Clarice Lispector na Itália de 1944, cortando as unhas dos pés dos pracinhas. Elza foi, de fato, uma pessoa única e sempre guardarei na memória nossas conversas, assim como sua dedicação total ao Brasil”, disse Moser ao saber da morte da veterana.
Segundo informações de periódicos de Alagoas, terra dos pais de Elza, ela sonhava em lutar na linha de frente, mas teve que se conformar em seguir como uma das 73 enfermeiras no Destacamento Precursor de Saúde da Força Expedicionária Brasileira, já que, na época, o Exército Brasileiro não aceitava mulheres combatentes.
O Comando Militar do Leste detalhou a participação de Elza na guerra: ela trabalhou nos hospitais de evacuação na Itália e nenhum soldado que foi tratado por ela morreu. Atuou como oficial de ligação e enfermeira-chefe no 7th Station Hospital, em Livorno. Com o fim da guerra, foi dispensada logo após o retorno ao país, indo trabalhar no Banco do Brasil.
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Come-se e bebe-se bem por aqui
Por Cosac Naify
Quarta-feira, 9 dezembro, 2009, às 12:11Nem só de arte viveram nossos autores. Entre uma discussão literária e uma ideia brilhante, uma inspiração e uma frase perfeitamente construída, petiscos, pratos bem temperados ou a melhor safra eram degustados com primor. Os exemplos, colhidos em obras de nosso catálogo, são dos mais saborosos.
Em Meu último suspiro, autobiografia de Luis Buñuel, um especialista nos deleites desta vida, o cineasta espanhol fala sobre aspectos fundamentais de seu cotidiano. No capítulo “Os prazeres deste mundo”, ele conta como o bar sempre foi, para ele, um lugar de “meditação e recolhimento, sem o qual a vida é inconcebível”, e ensina passo-a-passo como preparar um bom dry martini, seu drink preferido:
“Considerando o papel primordial que ele [o dry martini] desempenhou nesta vida que relato, vejo-me obrigado a dedicar-lhe uma ou duas páginas. [...] Peço licença para dar minha receita pessoal, fruto de longa experiência, com a qual continuo a obter um sucesso lisonjeador. Guardo tudo o que é necessário no congelador na véspera do dia em que espero meus convidados, os copos, o gim, a coqueteleira. Tenho um termômetro que me permite certificar-me de que o gelo está numa temperatura de cerca de vinte graus abaixo de zero. No dia seguinte, quando chegam os amigos, pego tudo de que preciso. Sobre o gelo bem duro despejo algumas gotas de Noilly-Prat e meia colherinha de café de angustura. Agito tudo, depois jogo fora o líquido. Preservo apenas o gelo, que carrega o ligeiro vestígio dos dois perfumes, e sobre o gelo despejo o gim puro. Sacudo um pouco mais e sirvo. É só isso, mas é insuperável.”
Já a célebre casa parisiense de Gertrude Stein, na Rue de Fleurus, retratada em A autobiografia de Alice B. Toklas, além de se tornar o palco modernista de discussões sobre arte e literatura, ficou também conhecida por ofertar boa comida e bebida. Ernest Hemingway, em Paris é uma festa, contou: “Era como uma das melhores salas do mais belo museu, com a vantagem de haver uma enorme lareira que nos proporcionava calor e conforto e de elas nos oferecerem boas coisas para comer, além de chá e licores”.
Em Clarice,, no capítulo “Galinha ao molho pardo”, o biografo Benjamin Moser fala sobre a relação da autora com os animais, principalmente em seus livros infantis, como é o caso de uma galinha muito especial, protagonista de A vida íntima de Laura (1974), que por pouco não vai foi para a panela:
“Existe um modo de comer galinha que se chama ‘galinha ao molho pardo’. Você já comeu? O molho é feito com o sangue da galinha. Mas não adianta mandar comprar galinha morta: tem que ser viva e matada em casa para aproveitar o sangue. E isto eu não faço. Nada de matar galinha. Mas que é comida gostosa, é. A gente come com arroz branco e bem solto.”
Poderíamos continuar com água na boca ao falar dos doces de Elio Vittorini em Conversa na Sicília, do inigualável banquete descrito em Satíricon, de Petrônio, receitas para vários outros posts. Mas o blog da Cosac Naify prefere perguntar aos leitores: qual era o prato ou a bebida predileta de seu autor preferido? Mande o seu comentário!
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E Tchechelnik entrou no mapa
Por Cosac Naify
Quarta-feira, 25 novembro, 2009, às 12:42Visualizar Ucrânia Ocidental, c. 1920 em um mapa maior
Os últimos dois ou três meses foram especiais para Tchechelnik. Dois eventos sem a menor relação direta puseram no mapa essa aldeiazinha ucraniana. Mais ou menos ao mesmo tempo, a Ucrânia entrou no Google Maps e foi lançada uma nova e original biografia da filha mais famosa de Tchechelnik: Clarice Lispector. Ou, para nós, brasileiros, apenas Clarice. Ou, para Benjamin Moser, seu biógrafo norte-americano, Clarice,
Ela escreveu:
“Nasci na Ucrânia, terra de meus pais. Nasci numa aldeia chamada Tchechelnik, que não figura no mapa de tão pequena e insignificante. Quando minha mãe estava grávida de mim, meus pais já estavam se encaminhando para os Estados Unidos ou Brasil, ainda não haviam decidido: pararam em Tchechelnik para eu nascer, e prosseguiram viagem. Cheguei ao Brasil com apenas dois meses de idade.”
De fato, até chegar ao Google Maps essa região da Ucrânia padeceu de uma espantosa falta de informação cartográfica, em parte devido aos mapas errados feitos pelos soviéticos para confundir os invasores ocidentais — que na verdade nunca chegaram até lá.
Quem chegou até lá foi Benjamin Moser, e fazer isso, ainda hoje, é difícil e demorado, depende de guias e de informações que se revelam desencontradas, quando não são pistas falsas. O mapeamento pelo Google é coisa recentíssima, de semanas ou meses para cá.
Uma vista mais ampla da região mostra que a noroeste de Tchechelnik não há, até hoje, praticamente nada, nem povoamento nem estradas. Benjamin Moser nos dá uma ideia do que podemos encontrar no lugarejo:
“Sua periclitante arquitetura de aldeia, pitorescamente pintada de verde e púrpura, é interrompida por umas poucas intervenções soviéticas de concreto caindo aos pedaços. Outros edifícios lembram populações desaparecidas: os católicos que rezavam na igreja polonesa foram embora faz tempo, e a sinagoga aonde Mania e Pinkhas Lispector teriam levado sua filha recém-nascida para ser abençoada está num triste estado, vazia, exposta às intempéries por trás da fachada de pedra ainda impressionante.”
Moser imagina que a recém-nascida viu, se é que viu, uma Tchechelnik bem diferente:
“Em 1920, só na cidadezinha de Tchechelnik, quinhentas moradias de camponeses foram saqueadas. O comércio foi destruído, os campos ficaram sem cultivo, grassaram epidemias. A fome reinava. Seis anos antes, Tchechelnik tinha 8 867 habitantes. Em janeiro de 1921, a população se reduzira a menos da metade.”
Era a temporada dos pogroms, as ondas de ataques (saques, destruição, humilhação, assassinatos, estupros) contra as populações judaicas da região, num sinistro método de limpeza étnica ainda praticado em plena Europa até há pouco tempo. Em O Exército de Cavalaria Isaac Bábel faz um quadro estilhaçado da barbárie e da miséria em que a Ucrânia estava mergulhada nos anos que se seguiram à revolução de 1917 — horrores que os pais de Clarice viveram da maneira mais extrema.
A reconstituição desse terrível momento em que nasceu uma escritora extraordinária é um dos pontos altos da narrativa de Benjamin Moser, que traz dados e descrições impressionantes sobre aquele canto do mundo que parecia esquecido por Deus.
Agora que a Ucrânia está a dois cliques do Brasil, selecionamos alguns pontos por onde passaram os Lispector até chegar entre nós. Vamos usar o Google Maps para rememorar a odisseia e a coragem de Mania, Pinkhas, Leah, Tania e a pequena Chaya — que, mesmo sob um frio de 20 graus negativos, recém-nascida naquele 10 de dezembro de 1920, já era, temos certeza, Clarice Lispector.
Basta clicar em “Visualizar em um mapa maior”, embaixo da imagem, e navegar pelo mapa, seja pelas legendas, que marcam os principais pontos por onde os Lispector passaram, seja pelo zoom (na barra do lado esquerdo da tela), para ver Tchechelnik em detalhes.
O lançamento de Clarice, será na Livraria da Travessa de Ipanema, no Rio de Janeiro, nesta quinta-feira. Às 19h30, começará o bate-papo de Benjamin Moser com Cristiane Costa, e depois haverá sessão de autógrafos. Os 100 primeiros exemplares comprados na livraria ganharão um pôster com a foto de Clarice por Claudia Andujar.
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O lançamento de Clarice, uma biografia teve apoio da Suzano de Papel e Celulose
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Clarice e a esferográfica
Por Cosac Naify
Sábado, 21 novembro, 2009, às 16:06Leia abaixo a crônica de Humberto Werneck sobre seu primeiro encontro com Clarice Lispector — e também com o biógrafo dela, Benjamin Moser, a quem Werneck entrevistará nesta segunda-feira, na Livraria Cultura do Conjunto Nacional (av. Paulista, 2073, Teatro Eva Herz), às 18h00.
O texto saiu neste sábado, na coluna de Werneck no Outlook, o suplemento cultural do jornal Brasil Econômico, e foi cedido pelo editor do caderno, Fred Melo Paiva, a quem este blog agradece efusivamente. No mesmo Outlook, Ronaldo Bressane assina texto sobre Moser e seu livro, que chegou às livrarias brasileiras neste fim de semana.
Meu traumatismo ucraniano
Humberto Werneck
É um danado, esse Benjamin Moser. Lá no Texas, onde nasceu, ele cismou um dia de aprender mais uma língua (hoje seis estão no papo), e, tendo desistido do mandarim, escolheu o português. Não demorou muito e o moço, atualmente com 33 anos, caiu em cima de um livro de uma brasileira nascida na Ucrânia – e caiu também apaixonado. Daí a pouco estava o Benjamin metido na empreitada nada simples de biografar a escritora, com a complicação adicional, para um pesquisador, de estar morando na Holanda, longíssimo de onde viveu Clarice Lispector.
Por indicação de Alberto Dines, o gringo veio bater na minha porta, em São Paulo, falando um português espantosamente bom. Queria saber de uns escritores de Minas de quem Clarice foi amiga. Na minha condição de mineiro não-praticante, não pude ser de grande valia para o Benjamin, mas ganhei sua amizade – e, em incontáveis papos via skype, pude acompanhar a gestação de Clarice, (assim mesmo, com vírgula), livraço até por ter 650 páginas. Não é primeira biografia de Clarice, mas posso afirmar que se trata da melhor até agora. Tiro para o Benjamin meu imaginário chapéu. Que outro pesquisador se abalaria até a Ucrânia em busca de traços de quem lá viveu apenas sua primeiríssima infância, nos remotos anos 1920?
O lançamento do livro, na semana que vem, fez regurgitar a lembrança do meu primeiro e único encontro com Clarice, acontecimento que foi para mim, se me permitem, um traumatismo ucraniano.
Andava eu pelos 23 anos e estava recém-chegado à redação do magnífico suplemento literário que o contista Murilo Rubião tivera a audácia de criar como encarte semanal do insípido diário oficial do governo mineiro. Fiado num conto que ajudara a premiar num concurso universitário, Murilo não só me levou para trabalhar com ele como deu ao frangote desmedida corda. Coro de vergonha retroativa ao recordar a petulância com que eu, peremptório, dava palpite nos irretocáveis contos do próprio Murilo, tendo chegado, Deus meu, a pedir ao escritor perfeccionista que trocasse isso ou aquilo em textos consagrados antes mesmo de minha vinda ao mundo.
Um dia Murilo me contou que Clarice Lispector estava em Belo Horizonte e me encarregou de pedir a ela um conto inédito e uma entrevista. O ano era 1968. Me lembro da reverência embasbacada com que a abordei numa roda de livraria. Não sabia ainda dos espinhos que Clarice eriçava às vezes no contato com estranhos, e gelei quando, ao ouvir o pedido de colaboração, ela indagou, com rude incredulidade: “Mas vocês pagam?” (Sim, pouco mas pagávamos.) E acrescentou, com a dicção rascante de sua língua presa, que estava “muito pobrrre”. Entre outros safanões da sorte, tinha vivido, dois anos antes, o pesadelo daquele incêndio que por pouco não a matou e que apagou um tanto de sua legendária beleza.
Me lembro também de que na véspera da entrevista não consegui pegar no sono. E mais ainda da catástrofe que desencadeei com minha primeira pergunta, inspirada em algo que tinha lido alhures: “A paixão segundo G.H., não sendo um romance…”
Nem pude a concluir a frase. “COMO não é um rrromance?”, rugiu Clarice Lispector, petrificando o aprendiz de repórter. Uma foto, que revejo agora, teve a crueldade de registrar o instante em que, fulminado pelo olhar enviesado de Clarice, baixei a cabeça, disposto a ir lá dentro me suicidar. O que não a impediu, ao fim da entrevista, de pedir para ficar com minha esferográfica de estimação, de tinta violeta, que lhe estendera para um autógrafo no meu exemplar de A maçã no escuro: “Posso ficarrr parrra mim?” Po-o-de… — consegui tartamudear.
(Décadas depois, veja você, folheando o catálogo de uma exposição comemorativa dos 60 anos de Chico Buarque, dei com a reprodução de um bilhete de Clarice para o compositor, no final dos anos 60. O texto, datilografado, tem assinatura em tinta, você adivinhou, violeta! Pode ser a minha chance de entrar na história da literatura brasileira.)
*
O lançamento de Clarice, uma biografia teve apoio da Suzano de Papel e Celulose
Clarice: a história de uma foto, por Claudia Andujar
Por Cosac Naify
Terça-feira, 17 novembro, 2009, às 16:11
A fotógrafa Claudia Andujar relembra o encontro com Clarice Lispector, em 1961, quando fez a foto que hoje ilustra a capa da biografia Clarice, (lê-se “Clarice vírgula”), de Benjamin Moser.
“Fui à casa de Clarice Lispector para fotografá-la a pedido da revista Claudia, que naquele ano de 1961 preparava uma reportagem sobre a escritora. Pouco me lembro daquele dia perdido no tempo, mas há detalhes que guardo para sempre.
Ninguém da revista me acompanhava e fui recebida com muita simpatia por aquela mulher linda, vestida com simplicidade e elegância.
Conversamos pouco. Quis deixá-la à vontade para a foto, e perguntei como gostaria de se posicionar. Se não me engano, a ideia de sentar diante da máquina de escrever e começar a trabalhar em algum texto foi de Clarice. E então ela se deixou absorver pelo ato de escrever, completamente entregue, sem quase notar minha presença.”
Clarice e seus olhos de piscina
Como fazer a biografia de Clarice Lispector, que toda a sua vida baralhou as datas? A investigadora Nádia Battella Gotlib passou por Lisboa e explicou as dificuldades de que é feita a fotobiografia de uma escritora que se “ficcionalizou”
Isabel Coutinho
Eram os anos 40 e o poeta brasileiro Manuel Bandeira estava numa “tristeza danada” por causa de uma mulher. Saiu do Praia Bar, no Flamengo, e quando ia “na calçada” encontrou a jornalista e escritora Clarice Lispector, que passeava de braço dado com o seu noivo, Maury.
O poeta fica impressionado com “os olhos da moça”. E contou este episódio ao jornalista Rubem Braga que não perdeu tempo e escreveu uma crónica, O poeta e os olhos da moça, que começa assim: “Conversa vai, conversa vem, eu disse um nome de uma mulher. O poeta me confessou que há muitos, muitos anos, tem vontade de fazer um poema sobre uma história que ele teve com essa mulher a que chamaremos Maria. Espanto-me: não sabia que o poeta tinha tido alguma história com a Maria. Ele ri: ‘- Não pensa que eu tive um caso com ela. Foi apenas uma impressão minha, foi uma coisa tão subjectiva – mas inesquecível. (…) Quando vou pisando na calçada me encontro com Maria, que vem de braço dado com o noivo. Meus olhos entraram directamente nos seus. Meus olhos, com toda a minha tristeza, toda a minha alma desgraçada, entraram de repente nos seus, mergulharam completamente neles. Ela se deteve um instante – eu só via aqueles olhos verdes – e me recebeu como se fosse uma piscina(…).’” Quando Rubem Braga contou esta história a Clarice Lispector, ela não se conseguiu recordar desse encontro e olhou-o, “admirada, com os seus olhos de piscina”.
Para a professora universitária de literatura brasileira Nádia Battella Gotlib, autora da biografia “Clarice, uma vida que se conta” (1995) e mais recentemente da “Fotobiografia Clarice” (2008), esta é uma das melhores histórias que já ouviu sobre a escritora brasileira. Este encontro entre Manuel Bandeira e Clarice Lispector (1920-1977), contado por Rubem Braga, é aliás citado em “Fotobiografia Clarice “(ed. Edusp/Imprensa Oficial do Estado de São Paulo), cuja edição revista e aumentada saiu agora no Brasil e irá estar à venda em Portugal, onde Gotlib acaba de a lançar, no âmbito do cóloquio Clarice Lispector, que decorreu na Casa Fernando Pessoa (1 e 2 de Abril).
Como os detectives
A crónica que fala do poeta que se depara com uma mulher “em plena mocidade, em pleno esplendor de beleza e de felicidade” quando ele “estava na fossa” é um dos “melhores depoimentos” sobre Clarice na sua juventude. Rubem Braga só revelará a verdadeira identidade dos envolvidos nesta história – o verdadeiro nome de Maria dos olhos de piscina e do poeta – depois da morte de Lispector.
Foi também por vontade expressa da escritora que só foi tornado público depois da sua morte o único registo audiovisual que dela existe. Trata-se da entrevista que deu a Júlio Lerner, do programa Panorama Especial, onde com a sua voz, a “fala presa”, diz que faz questão de ser uma escritora “amadora” para manter a sua liberdade.
O trabalho de biografar Clarice Lispector é quase “detectivesco” porque a escritora brasileira de origem ucraniana fazia “questão de despistar” e de “sumir com sinais”. “A pesquisa de Clarice vai sempre caminhando, apesar da Clarice”, diz Nádia Battella Gotlib.
Enquanto preparava as aulas que dava na universidade e ia lendo a obra de Clarice, a professora começou a guardar imagens em pastas com a ideia de, um dia, as organizar. Eram imagens “xerografadas” retiradas de jornais e revistas a que se juntaram depois as imagens que encontrou nos acervos fotográficos de Clarice (na Fundação Casa Rui Barbosa e na casa do filho de Clarice, Paulo Gurgel Valente). Gotlib queria saber quando foi tirada determinada fotografia, em que circunstância e o que é que a autora estava produzindo naquele momento.
“Na realidade era um olhar meio sonhador tentando arrumar o material. Porque os estudiosos de Clarice que começaram nos anos 80 tinham um problema danado: nada batia em termos de datas. Ela ia mudando a data do nascimento em função do envelhecimento.” Num depoimento a escritora disse uma vez: “Nasci na Ucrânia. Quando? Não, não quero dizer.”
Nádia percebeu então que, para fazer “o histórico de Clarice”, teria que ir fazer uma pesquisa de campo. Começou a viajar. Foi para Recife e para Maceió, foi às escolas onde ela estudou procurar a documentação.
Grande ambiguidade
Foi também aos lugares onde Clarice viveu : Ucrânia, Itália, Suíça, Inglaterra, Estados Unidos (Clarice esteve 16 anos fora do Brasil). A biógrafa e investigadora foi a Tchetchélnik, na Ucrânia (na época Rússia), onde a escritora nasceu. E o romance autobiográfico No Exílio, de Elisa Lispector (irmã mais velha de Clarice, que não queria que ela publicasse o livro), onde se narra a história da família, foi também uma grande fonte de informação.
Na altura do encontro de Clarice Lispector com Manuel Bandeira esta ainda não tinha acabado o curso de Direito nem se tinha naturalizado brasileira para poder casar com Maury Gurgel Valente, o diplomata, pai dos seus filhos e de quem veio a separar-se anos depois. Ainda não tinha publicado o seu primeiro romance, Perto do Coração Selvagem, nem tinha viajado para a Europa e para Argel, onde numa carta às irmãs escreve “todo este mês de viagem nada tenho feito, nem lido, nem nada – sou inteiramente Clarice Gurgel Valente”.
A investigadora teve que vencer uma certa resistência da própria Clarice Lispector em relação à pesquisa. Não dela pessoalmente porque quando começou a trabalhar a escritora já havia morrido, mas da falta de depoimentos sem ambiguidade. “O que eu tinha era uma ficção ambígua que ao mesmo tempo apontava para uma direcção como para outra”, conta. Nádia Battella Gotlib teve que enfrentar esses caminhos muito ambivalentes.
“As histórias em torno de Clarice são muito pessoais. São produto de uma experiência muito pessoal de cada um em relação a ela. É uma literatura que ataca as entranhas da pessoa. Você nunca lê Clarice de fora: ou mergulha no texto ou não lê Clarice”, explica a biógrafa. “Os depoimentos que eu recolhi às vezes eram muito filtrados pela experiência da literatura. Não se sabia o que é que era invenção a partir da literatura – o que era criação de leitor -, ou o que é que era mesmo experiência de vida com a Clarice.”
Existe uma Clarice “ficcionalizada na memória das pessoas que a conheceram”, concluiu Nádia Battella Gotlib.
(artigo publicado no PÚBLICO de 6 de Abril de 2009)
Pela luz dos olhos meus(Vinicios de Morais)
ResponderExcluirQuando a luz dos olhos meus
E a luz dos olhos teus
Resolvem se encontrar
Ai que bom que isso é meu Deus
que frio que da o encontro desse olhar
Mas se a luz dos olho teus
resiste aos olhos meus só p' ra me provocar
Meu amor,juro por Deus me sinto incendiar
Meu amor,juro por Deus
Que a luz dos lhos meus ja nao pode esperar
Quero a luz dos olhos meus
Na luz dos olhos teus sem mais tará-tará
Pela luz dos olhos teus
Eu acho meu amor que só se pode achar
Que a luz dos olhos meus precisa se casar.
O sonho(Clarice Lispector)
ResponderExcluirSonhe com aquilo que você quer ser,
porque você possui apenas uma vida
e nela só se tem uma chance
de fazer aquilo que quer.
Tenha felicidade bastante para fazê-la doce
Dificuldades para fazê-la forte.
Tristeza para fazê-la humana.
E esperança suficiente para fazê-la feliz
As pessoas mais felizes não tem as melhores coisas.
Elas sabem fazer o melhor das oportunidades
que aparecem em seus caminhos.
A felicidade aparece para aqueles que choram.
Para aqueles que se machucam.
Para aqueles que buscam e tentam sempre.
E para aqueles que reconhecem
a importância das pessoas que passaram por suas vidas.
nome:Gabriele Resende
turma:6 ano b
---------poema--------------
ResponderExcluirQuerer (Pablo Neruda)
Não te quero senão porque te quero
E de querer-te a não querer-te chego
E de esperar-te quando não te espero
Passa meu coração do frio ao fogo.
Te quero só porque a ti te quero,
Te odeio sem fim, e odiando-te rogo,
E a medida de meu amor viageiro
É não ver-te e amar-te como um cego.
Talvez consumirá a luz de janeiro
Seu raio cruel, meu coração inteiro,
Roubando-me a chave do sossego.
Nesta história só eu morro
E morrerei de amor porque te quero,
Porque te quero, amor, a sangue e a fogo.
MANDADO POR=rafaela 6ano B
--------------poesia------------
ResponderExcluirsem titulo(gabriel fernando ribeiro)
Escalando uma
montanha
Com o medo a me
acompanhar
Sigo a risca a
façanha
De ao topo chegar...
Com as pernas
sempre a tremer
Sigo firme e forte
Sem jamais
estremecer!
E chegando ao topo
Vejo a recompensa
De que tudo posso
olhar
Olhar para a imensa
vista
Sem me cansar! ...
Canção do exílio
ResponderExcluirGonçalves Dias
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta um Sabiá;
As aves que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá.
Nosso céu tem mais estrelas,
Nossas várzeas tem mais flores,
Nossos bosques tem mais vida,
Nossas vidas mais amores.
Em cismar, sozinho, á noite,
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Minha terra tem primores,
Que tais não encontro cá;
Em cismar- sozinho, á noite-
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Não permita deus que eu morra;
Sem que eu volte para lá;
Sem que desfrute os primores,
Que não encontro por cá;
Sem qu'inda aviste as palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Maria Luiza Paz Campos 6ºAno B
sem titulo (CLARICE LISPECTOR)
ResponderExcluirSonhe com aquilo que você quiser.
Seja o que você quer ser,
porque você possui apenas uma vida e nela
só se tem uma chance
de fazer aquilo que quer.
Tenha felicidade bastante para fazê-la doce.
Dificuldades para fazê-la forte.
Tristeza para fazê-la humana.
E esperança suficiente para fazê-la feliz.
As pessoas mais felizes não têm as melhores coisas.
Elas sabem fazer o melhor das oportunidades
que aparecem em seus caminhos.
A felicidade aparece para aqueles que choram.
Para aqueles que se machucam.
Para aqueles que buscam e tentam sempre.
E para aqueles que reconhecem a importância das pessoas
que passam por suas vidas.
Natália SaNTOS 5ºano B